“Amei aquele homem até perder a
dignidade!”, essa foi a celebre frase da filósofa Srta. Pipa ao relatar sua
vida afetiva em julho desse ano e que vem ecoando em minha alma confusa entre
as duas verdades que encerra.
Adoro histórias, as amorosas me
encantam sobremaneira. Acho incrível quando as pessoas contam, espantadas,
sobre a capacidade de expansão e elasticidade dos seus limites, para além do
que podiam imaginar sobre si mesmos, quando tocados pelo amor, quando movidos
por essa energia de força inenarrável.
Talvez aí o “Q” da questão:
SERÁ QUE AMARAM ATÉ PERDER A DIGNIDADE MESMO???
Eu, de minha parte, do clube
dos românticos de carteirinha, adoro pensar que sim, mas sei que não... E tenho todo prazer em compartilhar essa
ideia:
O amor na verdade é uma projeção.
Temos conosco mesmos uma identificação que nos faz, em circunstâncias normais,
querer pra nós o bem, a felicidade, a alegria... Quando amamos DE VERDADE,
agregamos outra identidade à nossa e, automaticamente, projetamos todo bem que
nos queremos ao outro, criando mesmo a ideia de que somos felizes se o outro tá
feliz, que nosso sorriso é mais alegre se o outro sorri, e a nossa felicidade
só é completa se o outro está nela. Essa projeção cria um suposto esvaziamento
de si. O “eucentrismo” é minimizado e cria-se um “outrocentrismo” afetivo.
Dessa dinâmica podem surgir
duas realidades:
1 – O amor é recíproco – você
ama, se esvazia, e se projeta em felicidade no outro, que também TE AMA, se
esvazia, e se projeta em felicidade sobre você. Os supostos vazios são
preenchidos pela presença da projeção do outro. Saímos de casa pra habitar o
outro que vem e habita em nós e assim se estabelece uma relação intrínseca entre
as subjetividades, sem nenhuma sensação de perda, mas de troca, partilha,
comunhão.
2 – O amor não é recíproco –
talvez seja essa a dinâmica mais comum ou mais popularizada. Você ama, se
esvazia, e se projeta em felicidade no outro, que também SE AMA e, por se
querer egoticamente demais, não se esvazia, e se projeta em felicidade sobre SI
MESMO APENAS, e goza a ideia de ter dois, ele e você projetados em felicidade
sobre ele mesmo. Assim, a sua projeção gerou um suposto vazio que não é
preenchido pela participação do outro. Na partilha de quereres, você não é contemplado,
e isso causa uma sensação dolorosa, aqui entendida como a perda da dignidade –
tudo é para o outro e nada supostamente é pra você.
O outro se quer e tem o seu
querer. Você quer o outro. Placar desigual: 2x0. Mas você não admite perder o
campeonato. Você é amante, tá movido por essa força incrível, que é o amor, e
acredita que é capaz de reverter esse placar, nem que seja na prorrogação. E
você dá ainda mais de si, esvazia a dispensa de sua “dignidade” indo sempre
além, empenhando sempre mais, vendo o final eminente da partida, mas sem
admitir a possibilidade de perder, porque perder e inversamente proporcional ao
amor, que só admite multiplicar.
Aqui retomamos um ponto já
comentado: a capacidade de expansão e elasticidade dos limites. Pra vencer esse
jogo perdido, você precisa ir muito além do que foi até então, precisa levar os
seus limites à sua máxima extensão, e essa ampliação é maior quanto mais o
cronometro indica o final da partida, ainda perdida em desvantagem pra você.
Mas o jogo acaba. Sempre chega
a hora, quando se estabelece o JOGO, a BRINCADEIRA com os sentimentos, que o
tempo acaba e aparece na tela o GAME OVER. Você perdeu! Lutou até as raias da
loucura, mas perdeu. Jogava sozinho. E, supostamente perdedor, passa a gozar da
ideia confusa do: AMEI ATÉ PERDER A DIGNIDADE.
Mas será?
Agora circulando pela
engenharia e arquitetura, da vida e da alma, para qualquer obra de expansão,
precisa-se mesmo esvazia a casa. Nossa casa é nossa alma. Pra levar a bom termo
essa expansão de limites, de compreensões, saímos em direção ao outro enquanto
em nós a casa vai sendo reformada, muros derrubados, espaços redimensionados.
Expansão é aumento de tamanho. A alma está sendo redimensionada, reformada em
amplidão.
O jogo terminou. Você perdeu.
As luzes do estádio se apagaram. Exausto, você volta pra casa, tentando emendar
a pouca ou quase nenhuma dignidade que você acha que lhe resta. Mas quando você
chega em casa... Meu amigo, minha amiga, quando você chega em casa, dorme,
recobra suas forças, e ACORDA, você descobre os incríveis espaços que todo esse
aparente esvaziamento de dignidade lhe proporcionou, e você a redescobre
ampliada duas, até três vezes mais.
Você pode até achar estranho,
inicialmente, ocupar todo esse espaço de dignidade sozinho. Os móveis da alma
agora estão pequenos demais para os espaços novos. É só o começo de mais uma
reforma que precisa passar por várias áreas em você.
Depois de tudo prontinho. Você (nós)
esta(remos) pronto(s) pra acolher um amor ainda maior. E cuidado para não
ocupar todos os espaços – vai ser bom pra alguém que chegar notar que você
deixou uns espaços na decoração reservados para o que o outro traz e agrega.
Agora pergunto: quem perdeu mesmo quando você amou até perder
a dignidade?????? Kkkkkkkkkkkkkk... Adoro esse revanchismo não maldoso
do amor: não perde quem deu, perde quem não partilhou...
ABENÇOADOS, mesmo sem o
perceber, SÃO os que amam até perder a dignidade. Nunca mais serão os mesmos...
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