quinta-feira, 26 de junho de 2014

OLHARES XXII - Os perigos de uma pseudointensidade


           Vivemos em um tempo onde se fala muito em intensidade. Parece que "o tempo" está cada vez mais curto e que se é preciso viver tudo com muita dessa tal intensidade enquanto se pode, enquanto se tem tempo, enquanto se é jovem... Já aí um primeiro equívoco: viver com intensidade não tem a ver com idade, gênero ou condição social; não é privilégio dos jovens, como possa parecer.
Talvez, se trocássemos a palavra intensidade por paixão, e ao invés de dizer “viver com intensidade” disséssemos “viver com paixão”, essa noção de viver olhando para tudo com uma potencialidade de força ficasse melhor entendida. Olhar a vida e as coisas com paixão... É só lembrar o que sentimos quando estamos apaixonados: nos sentimos mais bonitos, mais alegres, olhamos para tudo com mais leveza, nos sentimos mais vivos, mais intensos... kkkkkkkkkk... Retornamos então à intensidade, e sobre ela lançaremos nosso olhar de hoje:
“Os perigos de uma pseudointensidade”.
Já vimos que a ideia de intensidade na vida que apregoamos tá muito relacionada à paixão, a uma postura mais encantada, e nem por isso fraca, sobre a vida e as coisas, uma vontade de viver mais e melhor. Mas nem pra todo mundo é assim! Para a maioria das pessoas, essa máxima da intensidade se aproxima muito da etimologia da palavra – em tensão. E para entender melhor isso precisaríamos de uma noção de física, força, tensão, noções essas que vou abrir mão e usar de um exemplo bem simples, do nosso dia-a-dia: alguém de vocês já colocou um varal em casa? É, desses de pendurar roupas mesmo, de plástico, bem populares? Não?! Kkkkkkkkk... Mas é fácil entender. Se colocamos o varal esticado demais, ele fica sujeito a uma tensão e, ao colocar as roupas, o peso delas aumenta essa tensão ultrapassando o que o varal consegue suportar e ele quebra, se parte... Por outro lado, se você usar o mesmo varal, só que o esticando menos, quando sob o peso da roupa, essa tensão não se aproxima tanto do máximo suportado, ele se expande, se adapta, acomoda, e não se parte.
Exemplo mamão com açúcar demais????? Vou provar que não!
Algumas pessoas vivem suas vidas e relações como que esticando varais; parecem que precisam testar a força e durabilidade das coisas, dos sonhos, das pessoas nas suas vidas... Esticam, esticam, forçam, submetem tudo á tensão que experimentam, vivem em tensão, e acham que isso é viver “in tensamente”. Para essa pessoas, nada dura e, principalmente, não duram as relações... E o que hoje não é relação????? Nos relacionamos conosco mesmos, bem ou mal, mas nos relacionamos; com os amigos, com a família, com os amores, com os companheiros de trabalho, com a cultura, com o planeta... para esses pseudointensos, todas essas relações precisam ser testadas, precisam ver até que ponto podem suportar, esticar, mas, como tudo tem um coeficiente de tensão suportável, de tanto tentar, de tanto esticar, quebram e partem... e SE partem... nada tem continuidade... parecem não ter aprendido que, sujeitando a certa tensão, mas sem chegar aos limites, deixando sempre uma margem de força, o varal que nos une às nossas relações pode durar mais, suportar mais...
Ainda falando sobre esse pseudointensos, suas vidas não tem continuidade, vão acumulando histórias partidas, relações despedaçadas, e acham que isso é viver bem, é viver muito... Se acham tão intensos, mas são apenas fracos, e na possibilidade da menor tensão que os toquem, rompem e partem, partem e somem, fazem malas e partem em busca de novas possibilidades de tensionar e romper, romper e novamente partir, se esconder, chorar...
Na minha humilde opinião, sabe como saber se uma pessoa é de fato intensa? Descubra quantos amigos verdadeiros ela tem, mas daqueles que você sabe que pode confiar mesmo, e descubra quanto tempo tem essas relações. Quanto mais duradouras forem, mas intensas são essas pessoas. Anos a fio tensionando, experimentando, escolhendo o melhor momento, sabendo até que pode se pode ir, quando se deve retornar, se aproximando muitas vezes da tensão máxima suportável a ponto de romper, mas empenhando ainda mais força para manter, não partir, permanecer... esses são intensos de fato!!!
Não sei em que grupo você se enquadra, se é que podemos falar em grupos. Às vezes, precisamos mesmo testar o limite, a tensão suportada, de algumas relações para não correr o risco, quando como se lava roupas e vai estende-las super satisfeito, e o varal não é de confiança, e as roupas terminam no chão. Mas não posso deixar de concluir esse olhar sem parafrasear o Mestre:

 Bem aventurados os intensos, que sabem esticar sem romper, que sabem intensificar sem tensos ficar, sem tensões desnecessárias causar; sem arrependimentos pra sentir nem mágoas pra guardar... Bem aventurados os que vivem a vida sob o sabor da paixão, que sabem manter em suas relações aquele viço primeiro que, indiferente a idade, olham para cada dia como uma possibilidade ímpar de se ser muito feliz... E bem aventurados ainda nós que nos perdemos e não sabemos fazer nada disso, mas que NUNCA deixaremos de tentar...

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