segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Aos que AMARAM ATÉ PERDER A DIGNIDADE

“Amei aquele homem até perder a dignidade!”, essa foi a celebre frase da filósofa Srta. Pipa ao relatar sua vida afetiva em julho desse ano e que vem ecoando em minha alma confusa entre as duas verdades que encerra.
Adoro histórias, as amorosas me encantam sobremaneira. Acho incrível quando as pessoas contam, espantadas, sobre a capacidade de expansão e elasticidade dos seus limites, para além do que podiam imaginar sobre si mesmos, quando tocados pelo amor, quando movidos por essa energia de força inenarrável.
Talvez aí o “Q” da questão: SERÁ QUE AMARAM ATÉ PERDER A DIGNIDADE MESMO???
Eu, de minha parte, do clube dos românticos de carteirinha, adoro pensar que sim, mas sei que não...  E tenho todo prazer em compartilhar essa ideia:
O amor na verdade é uma projeção. Temos conosco mesmos uma identificação que nos faz, em circunstâncias normais, querer pra nós o bem, a felicidade, a alegria... Quando amamos DE VERDADE, agregamos outra identidade à nossa e, automaticamente, projetamos todo bem que nos queremos ao outro, criando mesmo a ideia de que somos felizes se o outro tá feliz, que nosso sorriso é mais alegre se o outro sorri, e a nossa felicidade só é completa se o outro está nela. Essa projeção cria um suposto esvaziamento de si. O “eucentrismo” é minimizado e cria-se um “outrocentrismo” afetivo.
Dessa dinâmica podem surgir duas realidades:
1 – O amor é recíproco – você ama, se esvazia, e se projeta em felicidade no outro, que também TE AMA, se esvazia, e se projeta em felicidade sobre você. Os supostos vazios são preenchidos pela presença da projeção do outro. Saímos de casa pra habitar o outro que vem e habita em nós e assim se estabelece uma relação intrínseca entre as subjetividades, sem nenhuma sensação de perda, mas de troca, partilha, comunhão.
2 – O amor não é recíproco – talvez seja essa a dinâmica mais comum ou mais popularizada. Você ama, se esvazia, e se projeta em felicidade no outro, que também SE AMA e, por se querer egoticamente demais, não se esvazia, e se projeta em felicidade sobre SI MESMO APENAS, e goza a ideia de ter dois, ele e você projetados em felicidade sobre ele mesmo. Assim, a sua projeção gerou um suposto vazio que não é preenchido pela participação do outro. Na partilha de quereres, você não é contemplado, e isso causa uma sensação dolorosa, aqui entendida como a perda da dignidade – tudo é para o outro e nada supostamente é pra você.
O outro se quer e tem o seu querer. Você quer o outro. Placar desigual: 2x0. Mas você não admite perder o campeonato. Você é amante, tá movido por essa força incrível, que é o amor, e acredita que é capaz de reverter esse placar, nem que seja na prorrogação. E você dá ainda mais de si, esvazia a dispensa de sua “dignidade” indo sempre além, empenhando sempre mais, vendo o final eminente da partida, mas sem admitir a possibilidade de perder, porque perder e inversamente proporcional ao amor, que só admite multiplicar.
Aqui retomamos um ponto já comentado: a capacidade de expansão e elasticidade dos limites. Pra vencer esse jogo perdido, você precisa ir muito além do que foi até então, precisa levar os seus limites à sua máxima extensão, e essa ampliação é maior quanto mais o cronometro indica o final da partida, ainda perdida em desvantagem pra você.
Mas o jogo acaba. Sempre chega a hora, quando se estabelece o JOGO, a BRINCADEIRA com os sentimentos, que o tempo acaba e aparece na tela o GAME OVER. Você perdeu! Lutou até as raias da loucura, mas perdeu. Jogava sozinho. E, supostamente perdedor, passa a gozar da ideia confusa do: AMEI ATÉ PERDER A DIGNIDADE.
Mas será?
Agora circulando pela engenharia e arquitetura, da vida e da alma, para qualquer obra de expansão, precisa-se mesmo esvazia a casa. Nossa casa é nossa alma. Pra levar a bom termo essa expansão de limites, de compreensões, saímos em direção ao outro enquanto em nós a casa vai sendo reformada, muros derrubados, espaços redimensionados. Expansão é aumento de tamanho. A alma está sendo redimensionada, reformada em amplidão.
O jogo terminou. Você perdeu. As luzes do estádio se apagaram. Exausto, você volta pra casa, tentando emendar a pouca ou quase nenhuma dignidade que você acha que lhe resta. Mas quando você chega em casa... Meu amigo, minha amiga, quando você chega em casa, dorme, recobra suas forças, e ACORDA, você descobre os incríveis espaços que todo esse aparente esvaziamento de dignidade lhe proporcionou, e você a redescobre ampliada duas, até três vezes mais.
Você pode até achar estranho, inicialmente, ocupar todo esse espaço de dignidade sozinho. Os móveis da alma agora estão pequenos demais para os espaços novos. É só o começo de mais uma reforma que precisa passar por várias áreas em você.
Depois de tudo prontinho. Você (nós) esta(remos) pronto(s) pra acolher um amor ainda maior. E cuidado para não ocupar todos os espaços – vai ser bom pra alguém que chegar notar que você deixou uns espaços na decoração reservados para o que o outro traz e agrega.
Agora pergunto: quem perdeu mesmo quando você amou até perder a dignidade?????? Kkkkkkkkkkkkkk... Adoro esse revanchismo não maldoso do amor: não perde quem deu, perde quem não partilhou...

ABENÇOADOS, mesmo sem o perceber, SÃO os que amam até perder a dignidade. Nunca mais serão os mesmos...

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

QUANDO DESCOBRI-ME TRAIDOR

Olhei de um lado, do outro, de costas e de frente, procurando meu melhor ângulo. Não consegui decidir... Inconformado, virei-me do avesso... E descobri-me em ignorância: estou em tudo! Sou todos esses lados e também seus reversos, e posso olhar de cada um desses ângulos sem, no entanto, me perder.
Dei emancipação às minhas partes e as lancei, cada uma em uma direção diferente, em busca dos encantos das pessoas e da vida, da música e da arte que se escondem nas rotinas aparentemente mais patéticas, e me enviavam todos os encantos por um fio afetivo invisível mais eficaz que as mais eficazes fibras óticas, nutrindo a minha matriz de melodia e encantamento.
Daqui, do lugar rotineiro onde me escondo, quase um Clark kent atrás de grandes óculos e uma pasta de professor, dei por exercitar-me amante, e que exercício profundo de descentralização. Num quase abrir mão da imortalidade pela substanciação concreta do amor, enquanto todas as minhas partes iam pelo mundo em busca do encantamento, aqui, de aparência rotineira e medíocre, decidi por agregar à minha vontade, outra; aos meus sonhos, outros; à minha ideia de realização, outra... E de quanto aprendizado isso me foi!!! Antes, apenas sabendo-me amante, agora sendo amante.
E como é maravilhosa a alma amante!!! Ela sacode-nos em nossas raízes e balança nossos ramos mais extensos como que para testar nosso eixo e nossa segurança; confunde a nossa com outra segurança; faz mesmo acreditar que nosso coração bate em outro corpo poético; faz coisas imensas parecerem pequenas e, também seu inverso, coisas pequenas parecerem grandes; garante aos nossos limites uma elasticidade tão grande que nos constrangemos em nossa própria compreensão de nós mesmos...
Se me gostava amador, muito mais agora me gosto amante...
Meio patético, eu sei. Mas até esse ser patético me agrada... rsrsrsrsrsrs... Inclusive quando confunde alguns tolos que me acreditam apenas sabedor do uso do coração como único músculo que pulsa; ignorantes eu sua parca visão, e também não teriam como saber, sei fazer bom uso de outros músculos que pulsam, mas, estão certos, prefiro fazer-lhes uso em conjunto: um pulso estimulando outro, e outros em cadeia pelo corpo e pela alma até um êxtase real que dura horas, dias, semanas, anacrônico a qualquer simples ato que o tenha dado origem.
Escutei, de várias bocas, em várias perspectivas, que todo amor tem suas traições e, embora monogâmico de carteirinha, me descobri traidor. Deixei crescer em meu peito uma paixão antiga, e passei a dedicar meus pensamentos, minha saudade, a ela, de forma a, ao menos nesse instante, não poder estar em qualquer relação sem sentir-me infeliz e traidor.
Para não ser incoerente com tudo o que apregoei, desatei todos os laços, despi-me dos sonhos, peguei de volta o meu coração poético implantando meio que a força em peito outro, e saí, limpo, leve, alegre como a muito não me sentia, em busca da minha antiga paixão. Chorei porque, tendo-a mandado longe e em tantos caminhos, não sabia nem por onde começar a procurá-la. Apenas sentei e chorei a dor da minha saudade... Não imaginava que a verdade dessa saudade pudesse ir tão longe e percorrer os milhares de quilômetros de linhas invisíveis que nos uniam e, uma a uma, todas as partes que deixei livres, foram voltando, e por excelência, para cada uma fiz festa, porque não conseguia deixar de fazê-la tamanho o encantamento que me causavam a cada chegada, pela beleza amadurecida adquirida nesse tempo de emancipação.


E fomos chegando e compondo... compondo e chegando... reabilitando o que se partiu e partiu, sem nunca deixar de ser um, todo. Fomos compondo e chegando, pondo a mesa para um café demorado de fim de tarde. Fomos chegando e compondo a melodia dos que se reencontram...
E os dias, as bobagenzinhas próprias de corações pueril-senis, ganharam nova cor e novo encantamento, agora contempladas por uma multiplicidade de sentidos (sensações e olhares) que, mesmo que tivesse infinitas vidas, abriria mão de todas elas, para levar a cabo, em excelência, apenas uma, essa, vivendo todas no encantamento e na exuberância quase imperceptível de uma só.